19 de setembro de 2011

Por Um Fio

Joe Connelly faz pleno uso da sua experiência profissional (foi para-médico durante cerca de 10 anos) para escrever este livro, tanto no conteúdo, como na sua forma. No conteúdo, porque as descrições das situações de emergência são fabulosas e às vezes tão surreais que só podem ser verídicas. Na forma, porque não há qualquer dúvida que este livro foi escrito por alguém que trata o stress por tu.
As coisas que acontecem a Frank, personagem principal, levam à reflexão por parte do leitor sobre assuntos muito importantes para a humanidade como a solidão, a pobreza, a miséria humana ou a morte, e fazem que que este esteja à beira da loucura, falando com os fantasmas das pessoas que "matou" (ou melhor: não consegui salvar). O título original do livro é Bring out the dead, pregão da idade média do cangalheiro, imortalizado pelos Monty Python no magnífico Quest for the Holy Grail, o que faz muito mais sentido uma vez que todos os pacientes que Frank assiste no livro morrem, excepto um traficante de droga, que talvez merecesse morrer.
Por Um Fio deu origem a um filme homónimo de Martin Scorsese, que eu aconselho vivamente a ver, que segue, de forma bastante fiel, o conteúdo do livro. Quanto à forma não podiam ser mais dispares: Scorcese filma com planos lentos, a banda sonora, com o tema principal de Van Morrison, T. B. Sheets, arrasta-se pelas ruas de Nova York tal e qual como a ambulância velha com que Frank e os seus parceiros patrulham a noite dos drogados, prostitutas, traficantes, bêbados e todos aqueles que a Big Apple rejeita. Quanto ao livro, este é escrito de forma vertiginosa (lê-se num ápice), segundo a perspetiva de um homem acabado, a caminho da loucura induzida pelo stress, que bebe álcool e café para se acalmar. Não é, sem dúvida, o típico bêbado que se arrasta e vomita mas um homem que apesar de beber não consegue por de lado a enormidade da sua tarefa e os sonhos de salvar o mundo, uma pessoa de cada vez, vão dando lugar à certeza de que o mundo não pode nem quer ser salvo.

1 comentário:

  1. Olá, Dinis! Como sabes, não li o livro mas, daquilo que conheço do filme, a tua crítica está muito boa e dá mesmo vontade de ler. Aliás, este comentário tem mais a ver com isso: cada vez escreves melhor! Paula

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